Atualmente se fala muito em turismo sustentável, turismo ecológico, turismo rural ou outras denominações para um modelo com ênfase no meio ambiente. O turismo sustentável parece ser um trem no qual todos têm de embarcar, dadas as tendências internacionais e as condições competitivas do mercado.
O Chile não tem estado alheio ao boom deste tipo de desenvolvimento turístico e o Estado alimenta diversas iniciativas para avançar nesta meta, como determina a Lei de Turismo N° 20.423 de 2010: “O turismo constitui uma atividade estratégica para o desenvolvimento do país, sendo prioritário dentro das políticas de Estado, pelo que este deverá promovê-lo de modo harmônico e integral, impulsionando seu crescimento sustentável em conformidade com as características das regiões, comunidades e localidades do país” (Capítulo I, Artigo 2°). Assim, a sustentabilidade é o ponto que orienta as políticas públicas turísticas e a Estratégia Nacional de Turismo desde 2010.
No mesmo caminho, a Subsecretaria de Turismo criou “Certificação Turismo Sustentável” – caracterizada pela letra S maiúscula – que reconhecerá aqueles serviços de hospedagem chilenos – hotéis, hostels, chalés, etc. – que cumpram com 14 pontos básicos, que incluem uso de água e energia, proteção do patrimônio histórico e cultural, pegada de carbono, viabilidade econômica, entre outros critérios. O estímulo foi concebido com base em critérios adotados mundialmente, o que se traduzirá no reconhecimento do Global Sustainable Tourism Council àqueles que obtenham o selo.
Sem dúvida, é preciso deixar claro que, no Chile e no mundo, o conceito de turismo sustentável ainda não é unanimemente compreendido, o que pode levar a erros na sua aplicação e consequência posteriores. Não estamos falando de algo instantâneo, padronizado para todo o planeta que, seguindo certos passos, se pode implantar em qualquer país ou região. Uma certificação de sustentabilidade para um edifício ou um hotel parece uma estratégia de marketing para uma sociedade cada vez mais “consciente”. Mas conscientes de quê? Estamos conscientes de que a sustentabilidade implica custos de acordo com o tipo de negócio e o local onde se insere? Consideramos que cada lugar requer seu próprio desenvolvimento? Porque um plano de turismo varia quando implantado, por exemplo, em Juan Fernández ou em Puerto Varas?
Entende-se o desenvolvimento sustentável como “o uso, a conservação e a melhora dos recursos da comunidade para que se possam manter os processos ecológicos, dos quais depende a vida, agora e no futuro”. Esta é uma definição inicial. No entanto, outra que parece mais realista é a de Brundtland (1987) que diz: “...Não é um estado fixo de harmonia, mas sim um processo de troca no qual a exploração dos recursos, a direção das trocas, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se fazem coerentes com o futuro, bem como com as necessidades atuais. Assim, em última análise, deve basear-se em uma vontade política”. Esta última noção de sustentabilidade incorpora as atividades econômicas como uma variável importante da equação.
Do mesmo modo, a definição mais utilizada para o turismo é o “movimento temporário de pessoas (incluindo as que viajam a trabalho) a destinos fora dos seus lugares habituais de residência e trabalho, suas atividades durante sua estadia nos destinos e as instalações criadas para atender suas necessidades” (Mathieson e Wall, 1982).
Assim, qual é a definição de turismo sustentável? Para a melhor compreensão deste conceito, soma-se a análise de Krippendorf (1982) que distingue o que chama de “turismo leve”, ou seja, o de pequena escala em detrimento do de larga escala. É importante mencionar esta distinção, já que serve para entender a gama de diversidade que pode haver na implementação do turismo sustentável. Se antes esta atividade era representada por um hotel ou uma boa localização contrastando com o entorno, agora se pensa em um alojamento em acordo com sua realidade e com pouca alteração dos elementos autóctones da zona, zelando pelo respeito ao meio ambiente.
Em suma, um turismo sustentável deve ser leve, em pequena escala, uma forma ética de habitar e coexistir. Este tipo de turismo se encarregaria ainda de micro estratégias para oferecer serviços com qualidades regionais. Na maioria, surgem como iniciativas de propriedade local, motivados por uma comunidade igualmente local e não necessariamente através da promoção de agências turísticas. Por tudo isso, é importante considerar que não existe um modelo harmônico extensivo a todos os territórios locais. Deve-se criar um modelo a cada vez, com uma valorização franca do entorno como um lugar único, conhecendo a fundo suas potencialidades e debilidades, assim como suas reais possibilidades econômicas e comerciais. Com esta orientação projetei um hotel sustentável na Região de Valparaíso (na foto inicial), que inclui medidas passivas e ativas de economia de energia, como também uma integração com o entorno sem afetar a vegetação existente.
A dimensão integral do turismo sustentável dependerá necessariamente de uma estratégia geral do turismo que permita adotar a diversidade. Não obstante, é preciso lembrar que a sustentabilidade como cumprimento de requisitos pode não ser acessível a todos. O turismo sustentável tem custos que contemplam âmbitos sociais, culturais, energéticos, patrimoniais... Todos ao mesmo tempo. Não é fácil empreender no turismo nacional e tornar rentável um negócio turístico pequeno ou médio, pelo que o fomento por parte do Estado é fundamental.
Turismo integral em uma estratégia nacional
Algumas recomendações que podem contribuir à estratégia estatal quanto ao turismo são:
1. O Chile tem um potencial de crescimento turístico importante, o que se deve aos seus atrativos paisagísticos e ecológicos. É importante reorientar os recursos públicos para a inversão de serviços básicos que complementem esta atividade e que tenha efeitos em curto prazo.
2. Já existem no Chile muitas iniciativas de modelos de sustentabilidade em pequena escala e este conhecimento não deve ser desperdiçado. Ainda mais, deve ser promovido e difundido dentro e fora do país.
3. O crescimento do turismo sustentável no Chile já começou e, como a indústria encontra dificuldades, as regiões são presas fáceis aos encantos do turismo de larga escala. Uma ajuda econômica programada deve fomentar a adoção de um plano nacional de turismo em pequena escala.
4. Adicionalmente, o turismo tem um impacto real na redução da pobreza e permite à comunidade buscar uma melhor qualidade de vida.
5. Temos uma força criada pelos programas sociais, educacionais e jurídicos nos últimos anos. É uma oportunidade de ativas a comunidade local e os povoados, liderando este capital humano em um projeto de um futuro melhor.
6. Ao instrumentalizar um plano sustentável é preciso compreender as relações físicas, biológicas e sociais dos territórios mais vulneráveis. Nestes casos, deve-se agenciar tecnologias como a cartografia das zonas sensíveis, Algumas experiências de gestão de parques devem ser exploradas, especialmente quanto ao impacto dos visitantes ou atividades industriais. Do contrario, pode ocorrer o que vem acontecendo, por exemplo, em Tongoy, onde a contaminação ameaça a diversidade da fauna local, limitando seu potencial turístico.
7. Realizar estudos conectando oferta e demanda, integrando informações de diversos estratos para delinear e limitar a quantidade excessiva de turistas em lugares concentrados.
8. A melhora da estabilidade ambiental agregará valor às regiões e ajudará a mitigar os efeitos negativos da pobreza.
Conclusões
Em curto prazo, o Chile deveria amparar as normas de educação, legislação e planificação urbana e rural induzindo conceitos mais realistas e integrais de sustentabilidade em programas de formação prática. Estes podem ajudar as pessoas a entender esquemas financeiros e tornar a gestão mais eficiente, assim como se fez na Costa Rica, que incorpora as contribuições e empresas às áreas protegidas e serviços para o ecossistema, como compensação por parte das companhias mineradoras e indústrias que afetam o meio ambiente.
Ainda que este tipo de intervenção seja muito amplo, não devemos subestimar o potencial humano para conquistar pequenas vitórias. Um exemplo é observável em Florianópolis, onde o município educa e instrumentaliza a população para que reciclem latas e, além disso, deixem nelas as bitucas de cigarro que seriam jogadas na praia.
Somente os contínuos esforços na coordenação entre os contribuintes, as iniciativas legais, as leis de planejamento e as contínuas melhoras nas políticas de governo podem levar a resultados reais e eficazes em longo prazo.
O turismo sustentável não é simples nem rápido. É um compromisso entre indivíduos, empresas e organizações para a construção de uma visão para o futuro. Devem ser conscientes de que os benefícios são em médio e longo prazo e não devem esperar resultados imediatos, especialmente no turismo de pequena escala. O apoio financeiro e técnico deve ser proporcionado através de organizações não governamentais e do setor público, o qual deve considerar os custos do “turismo leve”, dando as mãos às pequenas e médias empresas para que estas entrem na dimensão sustentável.
Artigo original via Plataforma Urbana.
Tradução: Murilo Arruda, Equipe ArchDaily Brasil.